Magia repressora-PAPA DOC


Ditador haitiano usava o vodu para amedrontar a população e garantir sua presença no poder

Além dos tontons macoutes, capangas de sua milícia pessoal, François Duvalier, o Papa Doc, tinha um outro meio para manter os haitianos sob seu controle: o vodu. Seus laços com a religião deram um novo significado nas mentes do povo quando ele assumiu a presidência, em 1957.

Duvalier sempre defendeu a valorização da negritude e das tradições africanas. Com a publicação, em 1944, do livro L'Evolution Graduelle du Vaudou ("A evolução gradual do Vodu", inédito no Brasil), do qual foi co-autor, ele ganhou a reputação de especialista. Mas foi com seu método de dominação, bem sucedido graças à superstição e ao medo dos haitianos, que ele levou as pessoas, principalmente os residentes em áreas rurais, a considerá-lo um ser sobrenatural.

Papa Doc teve sucesso em convencer que era um líder semidivino. "Apenas os deuses podem tirar o poder de mim", afirmou certa vez. A idéia de sua missão como presidente vitalício foi cuidadosamente incorporada no contexto do vodu, que dava a ele um ar de invencibilidade. Em 1963, Papa Doc declarou, em relação a seus opositores: "Eles não podem me pegar, eu sou imaterial".

Sua expressão indecifrável, as roupas escuras, o jeito misterioso dos movimentos lentos e o falar sussurrante transmitiam a calma de um morto. Essa aparência sombria propagava temor entre as massas, que o viam como a encarnação do deus guardião dos cemitérios, Baron Samedi - impressão que ele próprio fazia questão de cultivar.

Desde que assumiu o cargo, Papa Doc convidava para visitas ao Palácio Nacional milhares de sacerdotes e feiticeiros do vodu, vindos das mais isoladas vilas do país, que lhe passavam informações e colaboravam com seu ar de onisciência. O grupo tinha grande influência sobre os fiéis, que passaram a encará-lo como um superfeiticeiro. Muitos dos hougans (sacerdotes vodus), conhecidas e temidas figuras locais, se tornaram tontons macoutes. A escolha desses homens era valiosa para garantir autoridade e atribuir a aura de poder sobrenatural de sua milícia, que passou a ser comandada por Zacharie Delva, um aterrorizante feiticeiro da cidade de Gonaïves.

Durante o governo de Papa Doc, surgiram rumores de estranhos ritos praticados no palácio, em que o presidente previa o futuro em tripas de cabras ou sentava em uma banheira, usando chapéu, para pedir conselhos aos deuses. Segundo ex-duvalieristas, ele chamava hougans e feiticeiros para o orientarem e chegou a desenvolver seus próprios métodos de clarividência. Com este fim, Papa Doc foi além: ordenou que cortassem a cabeça de um de seus opositores, o então capitão das Forças Armadas, Blucher Philogènes, e a levassem ao palácio, guardada em um balde de gelo, em um avião da Força Aérea. Correram notícias de que ele fazia longas sessões com a cabeça degolada e que ela teria revelado nomes de traidores e futuros planos.

Com seu suposto bom relacionamento com os deuses, Papa Doc induziu os haitianos a crerem que ele mesmo era uma divindade vodu. Membro do mais popular centro da religião no país, ele anunciou publicamente lealdade aos deuses tutelares (os espíritos que criaram e guiam o Haiti). Duvalier, o primeiro chefe de Estado a proclamar a legitimidade do vodu, aproveitou o grande significado da religião na cultura haitiana para usá-la como arma de repressão e tirania.





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